O uso da cláusula “Take Or Pay” ocasionou evolução na aplicação da Lei das Duplicatas
A cláusula “Take or Pay” (Leve ou Pague), é frequentemente utilizada em contratos de compra e venda, no qual uma das Partes se compromete a adquirir uma determinada quantidade de produtos ou serviços, ou a efetuar o pagamento de um valor pré-determinado, independentemente do seu consumo ou utilização efetiva.
O grande objetivo da cláusula “Take or Pay” é firmar obrigações entre as partes mesmo em cenários de oscilações de demandas ou variações nos volumes de consumo. Dessa forma, pode-se dizer que são duas as principais finalidades dessa cláusula, sendo: (I) alocar riscos entre as partes, e (ii) garantir o fluxo de receitas para o vendedor.
São diversos os cenários em que a cláusula “Take or Pay” pode ser aplicada, como por exemplo nos contratos de fornecimento de energia, gás, água ou commodities.
Diferentemente da tradicional cláusula penal, a cláusula “Take or Pay” possui natureza obrigacional, estando sujeita ao regime geral do direito das obrigações, o que gera controvérsias acerca da emissão de Duplicatas Mercantis relativas ao valor do consumo não consumado ou do produto não entregue.
Segundo as regras atinentes aos títulos de crédito, a Duplicata Mercantil deve conter informações sobre: as partes envolvidas, a descrição detalhada dos produtos ou serviços comercializados, o valor da operação, a data da sua emissão e o vencimento. A Duplicata Mercantil somente poderá ser sacada nas hipóteses de compra e venda mercantil, ou de prestação de serviços, sendo vedada sua utilização em outras situações.
Ao analisar essa situação, o Tribunal de Justiça de São Paulo declarou nulidade de emissão de Duplicatas com base na cláusula Take or Pay, sob o fundamento de que o título não representa a efetiva compra e venda e, portanto, não se reveste dos requisitos formais do crédito mercantil.
Ao analisar o caso, a ministra relatora do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Nancy Andrighi, considerou que a cláusula Take or Pay não deturpa o negócio jurídico e que não deixa de ser considerado uma relação de compra e venda.
Em sua decisão a ministra argumentou que a cláusula Take or Pay consiste em disposição contratual por meio da qual o comprador se obriga a pagar por uma quantidade mínima especificada no contrato, ainda que o insumo não seja entregue ou consumido, e, portanto, não desconfigura uma relação efetiva de compra e venda.
Ao nosso ver, a decisão da ministra põe luz à uma discussão importante sobre títulos de crédito que nascem de obrigações negociais claras e específicas, mas que, devido a rigidez interpretativa da legislação não permite ao credor utilizar dos meios executivos de cobrança. A decisão demonstra que o direito necessita de constantes alinhamentos com as práticas negociais de mercado a fim de empregar maior segurança jurídica às relações jurídicas empresariais no Brasil.