Ao longo de 20 anos de experiência com a advocacia empresarial um fato sempre me chamou a atenção: a falta de atenção dos empresários de pequeno e médio porte para com os estatutos sociais – ou contratos sociais de suas empresas.

Não é incomum que empresas sejam constituídas seguindo um modelo padrão de contrato social, normalmente sugerido por profissionais que promovem a abertura de empresas. Não que isso seja necessariamente errado, mas os efeitos dessa prática muitas vezes são maléficos, invisíveis aos olhos do empresário, mas que emergem diante da primeira discórdia societária.

O exercício da advocacia empresarial nos mostra que a maioria das empresas de pequeno e médio porte hoje constituídas são sociedades empresariais do tipo jurídico Sociedade de Responsabilidade Limitada (LTDA.), com a presença de dois sócios, sendo eles detentores de idêntica participação, ou seja, o famoso “50-50%”.

À primeira vista pode não parecer, mas este modelo de composição merece cuidados especiais. Isso porque os sócios nesta fase inicial mantêm um nível de comprometimento mútuo, afeição comercial e até pessoal que os leva a constituir a sociedade sob aspecto da igualdade de condições.

Com o decorrer das atividades, por fatores internos da sociedade, como por exemplo a gestão administrativa ou financeira, ou até mesmo por fatores externos como uma crise de mercado, o clima amistoso dos sócios pode mudar radicalmente, iniciando conflitos das mais variadas espécies. 

Empresas que são constituídas entre cônjuges, especialmente quando um deles somente se presta a fornecer seu nome para a composição societária e passam a enfrentar a separação conjugal, ou ainda, empresas familiares cuja disputa pelo poder e a gestão de uma sociedade pode emergir ou se acirrar após o falecimento de um dos sócios, são exemplos clássicos dos problemas que desencadeiam disputas entre sócios. 

E, uma vez instalado o problema, decisões importantes passam a ser tomadas como ferramentas de pressão à exclusão ou saída de um dos sócios como por exemplo a alteração da política de distribuição dos lucros, aporte adicional de capital social, alteração do administrador, alteração do objeto social, enfim, temas relevantes que exigem deliberações conjuntas sócios para sua efetivação, e que certamente não encontrarão a aprovação.

Situações como essas são praticamente impossíveis de serem superadas num quadro societário de 50/50. Isso porque o Código Civil brasileiro, que regulamenta as disposições da sociedade limitada, estabelece quóruns de votação para tomada de decisões relevantes da sociedade em reuniões que podem chegar a três quartos ou até a unanimidade do Capital Social. Decisões importantes, dessa forma, tornam-se problemas instransponíveis de forma extrajudicial, causando muitas vezes o “congelamento” da empresa e comprometimento direto de suas atividades.

Problemas como estes poderiam ser prevenidos com cláusulas e condições contratuais específicos que preveem situações que possam colocar em risco ou indiquem abalo da relação entre sócios, definindo-se fórmulas para a solução extrajudicial do conflito. É óbvio que tais soluções não podem contrariar as disposições legais e, neste compasso, dizemos que o contrato social ou até mesmo um acordo de quotistas é um terreno fértil para elaboração de mecanismos jurídicos de solução deste tipo de controvérsias.

Avaliação da empresa, regras de sucessão, foro adequado para discussão e fórmulas para superação de empate no quórum das deliberações são alguns exemplos de temas que um advogado especializado em Direito Societário está capacitado para ofertar a seus clientes, a partir do conhecimento do negócio e suas particularidades, e até mesmo pessoalidades dos sócios e seus familiares.

Por estes motivos seguramente o investimento do empresário na contratação da confecção de um contrato social particularizado, bem elaborado e “fechado” em questões que poderiam estagnar a empresa é infinitamente menor do que o custo do enfrentamento de uma disputa judicial.